sábado, 26 de fevereiro de 2011

Passion

Descobri que não consigo mais me apaixonar. Perdi a capacidade de me iludir. Antes eu vivia um conto de fadas cada vez que uma alma cruzava meu caminho. Acreditava estar vivendo o amor da minha vida. Não, isso não existe. As pessoas não pensam assim. Mesmo que tivessem esse ponto de vista, não tenho como sustentar um relacionamento. Para sair desse presídio é necessário subornar e ludibriar o carrasco carcereiro que vigia o portão. Ele é vil e cobra caro por tudo.

Afeição talvez seja o mais longe que consigo chegar hoje.

Não. Eu quero me apaixonar por alguém. Quero viver a magia novamente. Voltar a ser um adolescente. Viver minha prepotência.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Silent Woods - Lost Streets

A fumaça brotava e ficava para trás. Encolhia-me em minhas vestes negras para fugir das laminas gélidas que passavam vagarosamente. A escuridão vencia os pontos de luz ao longo do caminho traiçoeiro e abandonado. Nenhuma alma se atrevia a estar ali. Caminhava ignorando os temores do vazio e os monstros mentais à espreita. Os olhos cegos dos edifícios eram estáticos. Tudo era muito familiar como se eu houvesse projetado aquela cidade de sombras.

Ignorava o meu destino. Apareci ali desconhecendo as circunstâncias anteriores. Caminhava apenas a passos lentos. Indiferente. Não queria perguntar o porque, nem o onde. Era um elemento daquele cenário, tinha meu papel.

Uma luz surge em meio ao escuro denso das lojas abandonadas. Quem? Ou melhor, o que? Sigo agora com o andar confiante de quem vai a um compromisso. Quero acreditar que estão a minha espera, que serei aplaudido de pé por minha audiência. A solidão então para, deixo-a para trás. Agora que estou realmente sozinho tenho lugar para outra companhia.

O lugar era uma espécie de bar. Pub, sim, essa é a nomenclatura correta. A vidraça empoeirada apartava o interior da realidade externa. Era desconhecido para mim o que repousava no interior. Meu compromisso era inadiável, eu precisava entrar. Girei a maçaneta dourada em estilo art-noveau e um aroma de mofo e tabaco invadiu meus pulmões. A atmosfera daquele lugar tomou conta de mim. Varias mesas enfileiradas junto à parede e um balcão em madeira sucupira. Alguns quadros medonhos e apenas um dos lustres que ficavam sobre as mesas estava aceso. Sob esse estavam dois vultos que me eram familiares.

O passado doloroso apareceu como uma entidade invocada. Exorcisei-o. Não queria mais ter contato com aquele ser demoniaco que me assombrou por tanto tempo. Aproximei-me. Não conseguia vê-los mas suas vozes vinham a mim. Afeto, o sentimento predominante. Mesmo sabendo que os fantasmas da traição se travestem para enganar seus atormentados prossegui naquele diálogo. Era excitante ser relevado por aqueles seres que para mim eram como uma folha em branco. Eu podia fazer o desenho que me fosse conveniente. Porém se a realidade não fosse retratada poderia ser que ficasse vunerável. Não, quero os pintar como são ou piores que são. Preciso me blindar contra maldições do passado.

Um deles desapareceu em meio a fina neblina. A outra continuou comigo. Explicou-me sobre o desaparecido. Concordou, contou e ouviu. Não sou tão mal desenhista quando estou menos passional. Comecei a gostar daquele vulto que eu ignorava qual era sua real identidade.

Despedi-me com um beijo, era hora de partir. Logo após fechar a porta acendi novamente minha fumaça e uma voz me disse: " pise com cuidado nos ladrilhos certos". Desta vez darei ouvidos a ela, não quero me arrepender no futuro.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Silent Woods - O Chalé

O ar viciado dessa casa quente já fazia parte de mim como se estivesse sempre dentro de meus pulmões. Não preciso respirar mais, esse ambiente sou eu, introspectar-me é inócuo. A mobília morta é meu organismo e as paredes miseráveis a pele que me protege do exterior. A alma é a soma de tudo isso. Sólida feito a madeira que apodrece. Cansada feito as dobradiças que rangem. Presa feito as estacas que sustentam esse lugar.

Canso-me as vezes de estar em mim. Desencarno e saio pela porta que me expele para o mundo exterior. Saio do calor do meu corpo a procura de outros errantes que assim como eu estão vagueando pelo escuro, curiosos e aflitos.

Aqui fora tudo é frio, escuro, neblinoso, amedrontador. Apenas alguns postes de luz servem como orientação de qual caminho seguir para não se deixar seduzir pelo oculto. O alheio é misterioso e dai provém seu perigo. Pode ser que ele ataque e então será tarde demais para correr de volta para o lugar que insistimos em abandonar todas as noites. Nesse sonho coletivo somos a expressão do que esta nos nossos lares. Desde a característica marcante até o filigrama que ignoramos. Na verdade o porão que define como será o resto da casa. Nele o passado é guardado em baús esquecidos gritadores de prantos que ecoam dando forma aos ambientes que associamos como nosso verdadeiro habitat.

As vezes é emocionante ver outras almas que se parecem com você. Perdidas como você. Famintas como você. Saciar a angustia por alguém que invada sua casa, sua alma. Arrombar a porta e explore tudo que está por dentro. Ver aquilo que você esconde por trás da fachada. Mudar tudo de lugar e fazer de um ambiente novo com ares novos.

Nessa floresta encontrar outros residentes não é muito comum. Existem muitas bestas, vermes e insetos mas seres como eu são poucos. Ao encontrar um todo cuidado é pouco. Se não quiser que fuja o melhor a se fazer é prendelos como se prende os bois, mas não pelos chifres e sim pelas palavras. Não espere muito deles, não são capazes de atender a todas as expectativas.



No mais volto para o chalé para me preservar do limbo.

"Ele"

La estava ele sentado sob o velho lustre em agata. Atônito. Perdido. Solitário. Por entre os dedos da mão esquerda brotava a fumaça que subia até alcançar a escuridão. Descalço, com uma velha calça jeans e uma camiseta de malha preta. Cabelos castanhos um pouco volumosos que quando jovem eram motivo de complexo. Um quarto quente e fechado. Poeira. Livros. Pratileiras. Olhos vermelhos que ardiam como carvão em brasa. Simbolo de seu infinito introspecto em sua alma. Imoral.

Sozinho.

Estar sozinho as vezes é bom. Era cheio de amigos. Pra ser sincero todos eram como erva, divertidos apenas para a noite. Descartável. Apenas um era excessão. Era estranho, diferente de todos, diferente de tudo. Harmônico. Com o tempo havia aprendido sobre como ele se comportava. Como era interagir. Indecifrável.

Satisfeito.

Não precisava mais de amantes. Os velhos de hoje são como pão mofado. Os presentes e futuros são um mero luxo. Ostentação. Antes para ele tê-los grudados ao seu corpo era motivo de uma ansiedade sem limites. As vezes nem lembra disso mais. Faz questão de apreciar a beleza dos outros mas só. Restrito.

Pretencioso.

Fruto das mudanças que ao longo de duas décadas ocorreram. Algumas lentas movidas a pedradas. Outras rápidas levadas pelo vento.




Alegria. Euforia. Orgulho.

Por ser meramente, ele.

Mental

A densa floresta mantém a escuridão perturbadora.

Não há e nem nunca houve escudeiro algum.

As bestas ferozes estão à espreita.

O punhal negro de sangue.

A mente inquieta.

Fogo.